21 de outubro de 2015

Rock Brasileiro 60 Anos

Como diz a outra: loucura, loucura, loucura!!! Pasmem! O rock brasileiro completa 60 anos essa semana!

E essa data vem bem a calhar com o texto anterior. Vem a calhar porque pergunto: dos meios de comunicação conhecidos por todos os brasileiros, quais tem conhecimento dessa data, e quais irão falar a respeito? Uma resposta para duas perguntas: nenhum.

Brasileiro não tem memória. Se não sabe em quem votou na última eleição, como então saber que o rock brasileiro completa 60 anos essa semana? Infelizmente é assim. Não à toa o país é uma bagunça. Não cuidar da própria história é não cuidar de si (isso porque falo de cultura pop, imagine o resto!).

Uma pena que isso aconteça com uma data tão legal. Poderia ter, por toda essa semana, eventos e celebrações, shows especiais, pequenos festivais, programas de rádio e tv dedicados ao assunto. Departamentos de marketing, agencias de publicidade, criadores de conteúdo, todo mundo perde com a não valorização de nossa história.

Poderia se aproveitar que a maioria da velha guarda ainda está aí, como Caiubi Peixoto que gravou o primeiro rock cantado em português (“Rock’n’Roll em Copacabana"), Baby Santiago que trouxe brasilidade ao rock, Tony Campelo entre outros, e fazer uma grande homenagem juntando todas as décadas. Seria uma coisa bem legal, bastante significativa.

Porém infelizmente mesmo a mídia que se diz especializada vai deixar a data passar batida, mais uma vez, já que ao completar 10, 20, 30, 40, 50 anos, a data também foi esquecida.

Foi em 24 de outubro de 1955 que Nora Ney gravou “Rock Around The Clock”, em inglês, mas batizada de “Ronda das Horas”. Foi uma gravação feita para a trilha do filme de mesmo nome, que iria estrear aqui. Nora Ney era cantora de jazz, boleros e samba-canção, e foi convidada a gravar esse rock, porque sua pronúncia do inglês era perfeita, já que tinha uma bem sucedida carreira internacional.

Apesar dessa data ser um verdadeira marco para a cultura pop brasileira, ela não teve significado algum para Nora Ney, e esse fato é ignorado nos textos biográficos da cantora. Ironicamente Nora Ney morreu em 28 de outubro de 2003, 4 dias depois do rock brasileiro completar 48 anos.

Caubi Peixoto também teve sua rápida incursão no rock por pura falta de ídolos na época. Como era um dos mais populares cantores, foi convidado a cantar “Rock’n’Roll em Copacabana”, gravada em 1957.

Daí vieram outros artistas e cenas, a jovem guarda, o progressivo dos anos 70, o famoso rock dos anos 80, a “nova geração” 90, e os perdidos de 2000. Sempre aos trancos e barrancos.

Trancos e barrancos porque o Brasil nunca teve (e nunca terá) uma cultura rock. Natural. Normal

Dessa forma ele chegou aos 60. As gerações quase nada se falam entre elas. O que aconteceu na década de 70 foi bem diferente do que aconteceu nos anos 60, a mesma coisa serve em relação à década de 80 com 70; 90 com 80; e 2000 com 90.

Uma ou outra banda dos anos 90 citava bandas brasileiras dos anos 80 como influencia (Chico Science até gravou Fellini!). Mas você percebe que os 60 não influenciou os 70, os 70 não influenciou os 80, os 80 pouco influenciou os 90.

Dentro de todo esse universo são poucos os artistas que citam outros artistas brasileiros como influencia. É mais fácil você encontrar roqueiro brasileiro citando nomes da MPB e bossa nova, do que nomes do rock brasileiro.

Como influencia rock, olhamos 95% pra fora. Dois dos motivos são: 1) a falta de conhecimento 2) o preconceito. Doido falar em roqueiro preconceituoso, mas aqui no Brasil esse tipo é normal. Talvez um leve ao outro. Difícil encontrar alguém que conheça outros ótimos artistas fora do trivial. A jovem guarda tinha uma cena underground bem legal. 

Tinha quem gravasse músicas autorais, os truques de estúdio para chegar a certos timbres, as descobertas, os anos 60 tem seu valor. 

Tinham as bandas pesadas dos anos 70 que pecavam nas letras, mas arrebentavam na sonoridade. Eram tantas: Módulo 1000, Som Nosso de Cada Dia, Bixo da Seda, Vímana, Ave Sangria. Tinham bandas aos montes, festivais, temporadas de shows em teatros. Uma cena rica e de qualidade (em vários sentidos). Apesar disso, estava na marginal. Jornais até davam força, mas não havia espaço em rádio, o que era fundamental (se hoje ainda é, imagine nos 70...).

Nunca vi artista algum do rock brasileiro citar, Módulo 1000, O Terço, Paulo Bagunça, Spectrum, Gueto, Smack, Agentss, Patife Band, De Falla e tantas outras que são incríveis, mas que não chegaram ao enorme sucesso de outras.

Roqueiros brasileiros desconhecem a história do rock brasileiro. Desconhece o que não é trivial. Citar Secos e Molhados, Titãs e Raimundos e fácil.

As gerações de 70 e 80 até conhecem o passado, se lembram de bandas, shows, discos. Tem até uma parte dos artistas dos 80 que já estavam na estrada nos 70, como Rádio Taxi, Herva Doce, Lulu Santos...

A memória, e história, do rock brasileiro começou a ser desdenhada pela geração 90 e só piora conforme os anos passam. Tem roqueiro que acha que tudo começou a partir do Nirvana, ou pior, do Oasis. Vão no máximo para o trivial: Beatles, Stones, Ramones. Se com as gringas é assim, dizer o quê das brasileiras?

Você que faz rock pode até não gostar dessas bandas brasileiras que citei, mas tem a obrigação de conhecer.

Bem, de um jeito bastante bagunçado o rock brasileiro completa 60 anos. E ele é cheio de histórias, histórias de resistência, histórias de bravura... e alguns sobreviventes.

E viva o rock brasileiro!


PS1: Dizem que 2016 e 2017 serão anos bons para o rock brasileiro. Espero que isso seja verdade, mas também espero que essa crise braba não afete essa previsão. O que posso afirmar de próprio conhecimento, é que executivos de grandes gravadoras estão de olho e atentos.

PS2: Saiba de curiosidades e histórias do rock brasileiro, siga no Instagram: rockbrasileiro_



13 de outubro de 2015

O Desdém à Cultura Pop Brasileira e a Falta do Foda-se

Pessoal da Fluminense FM
É impressionante ver o quanto o próprio brasileiro desdenha de sua cultura. Aqui falo da cultura pop, da música e de um pouco de tudo.

Fico embasbacado em ver o quanto os meios de comunicação desprezam a editoria de música. Em um tempo onde ela é ultra consumida, está ao alcance de todos, há lançamentos de diversos formatos a todo instante: cds, álbuns virtuais, discos, dvds, livros, shows, turnês, videoclipes, documentários, filmes, quadrinhos, entre outros produtos; mas sabe o que a “mídia especializada” faz com tudo isso? Nada. Absolutamente nada.

Você abre o jornal das grandes capitais, principalmente Rio-SP, e vê o tanto de eventos que tem, e ninguém faz cobertura disso. Ninguém dá uma linha sobre o show que iniciou a turnê x, sobre o show que artista x gravou o dvd, da tarde de autógrafos e tudo o que está por trás daquele lançamento.

Costumo fazer analogia com o futebol. Perceba o que o jornalismo esportivo, especializado em futebol, faz com uma única partida de futebol: vai ao treino, quer entrevista coletiva e se possível uma exclusiva, mostra o antes, durante e depois da partida. Entrevista os jogadores, mostra os melhores momentos, discute certos lances, e tudo o que gira em torno dessa partida e do campeonato em questão.

Perdidos na Noite
Na cultura pop isso é completamente cabível. Quando eu trabalhava na MTV, todo ano apresentava projetos novos, programas novos. Entre eles o Ultrasom e o Quiz, que fizeram parte da grade durante alguns anos.

Outro projeto que apresentei mais de uma vez, foi um jornal em um formato de entretenimento, com convidados, opiniões, comentários, bem aos moldes dos programas sobre futebol. Sempre quis fazer um programa nesse formato. Mas por duas vezes a ideia foi recusada.

Enfim, quem pode fazer algo para ajudar a divulgar a cultura pop, a música, se nega. Não entende. O pior que isso não acontece só nos grandes jornais, revistas, nas grandes emissoras de tv fechadas ou abertas, nos grandes sites/portais da internet e também não só dentro da mídia que se diz especializada, segmentada. O medo de sair do lugar comum e sair da zona de conforto atinge também as gravadoras, os selos, as editoras e as grandes empresas que alimentam a cultura pop.

O departamento de marketing dessas empresas e o pessoal que cuida de certos conteúdos em agências de publicidade, seguem a risca o manual que aprenderam na faculdade. E ai de quem arriscar! Ai de quem sair do que está escrito!

Fábrica do Som
Hoje em dia há um fator essencial para a criação que está cada vez mais escasso, exatamente por conta desses universitários bundões que cheiram a fralda e que tem medo até de sair da casa dos pais, que tomam conta desses departamentos: é o fator ‘Foda-se’.

O que acontece com essa editoria é a mesma coisa que acontece no futebol, e no próprio mercado fonográfico: quem manda não entende lhufas. É como qualquer Ministro brasileiro: não existe um especializado na área em que foi posto.

Há dois meses tive a chance de ir conversar com o dono de uma rádio aqui de SP. Eu e um amigo. Fomos levar algumas ideias, conteúdo diferenciado. Em certo momento o dono perguntou: “o que acham da rádio?”. O amigo respondeu na lata: “careta”. O dono arregalou os olhos, e falamos de ideias que queríamos aplicar. Programas que gostaríamos de fazer. Lembramos da MTV em seu início, digo entre 1990 e 1996, que foi um grande período, e é exatamente o período em que todos daquela geração lembram com carinho e saudades. Esse foi o período exato em que reinou o ‘Foda-se’. Não tem um que não fale: “foi o melhor período da MTV”. O dono da rádio ficou assustado (no bom sentido), mesmo sendo ideias simples. Ele até concordou com algumas colocações que fizemos. Mas o medo do 'Foda-se' o fez ficar na dele.

Por que você acha que em SP todos lembram da TV Mix, programa na TV Gazeta que tinha Astrid, Sérginho Groisman, Grace Gianoukas, Marcelo Mansfield? Porque era uma zona absoluta, onde o ‘Foda-se’ também reinava. Dá pra lembrar também do Fábrica do Som (Tv Cultura), Perdidos na Noite (Band), e tantos outros programas locais. Dá pra lembrar da Fluminense FM, do Circo Voador, do Lira Paulistana, Madama Satã, as revistas Pipoca Moderna e Roll. Era tudo ligado ao ‘Foda-se’. Um bom exemplo recente é o programa Pânico. Quer mais ‘Foda-se’ que aquele começo do Pânico na televisão? Fez até a Globo mudar.

MTV 1991
E sabe no que resultou todos esses ‘Foda-ses’? Em uma geração super criativa, em boas lembranças; em histórias que se tornaram livros, documentários e filmes. Tudo isso resultou em mudança de comportamento, na quebra de paradigmas. Infelizmente isso está escasso hoje, por causa de tanta gente bundona que toma conta das chefias desses meios de comunicação, e que cada vez mais tem medo de arriscar, de ligar o ‘Foda-se’.

Hoje esse medo, essa coisa bundona, a falta do ‘Foda-se’ atinge exatamente as áreas que sempre foram vistas como sendo de vanguarda. Agora tudo é padronizado, robotizado (inclusive os piercings e as tatuagens desse pessoal). Assim é mais fácil, como já disse, ninguém quer sair da zona de conforto.

Esse desdém à cultura pop brasileira deixa de arrecadar verba em publicidade e marketing, deixa de criar empregos, deixa de girar a economia, deixa de criar novos produtos. Todo mundo sai perdendo, principalmente quem poderia mais ganhar com isso.

PS: O livro 'Como a Geração Sexo, Drogas & Rock'n'Roll salvou Holywood' é um perfeito exemplo do que escrevi aqui.