16 de fevereiro de 2012

Série O Resgate da Memória: 26 - Os Mutantes na Veja (1968, 1969)


No próximo dia 24 de fevereiro o 2º disco d'Os Mutantes, simplesmente chamado de Mutantes, completará 43 anos (1969). Antecipando uma semana, trago todas as novidades desse lançamento... jeje.

Clássico absoluto do rock brasileiro!

Aqui transcrevi as duas primeiras reportagens da banda na revista Veja: a primeira de outubro de 1968, quando a revista tinha apenas 2 meses; a segunda de fevereiro de 1969, que fala exatamente do segundo disco. De quebra ainda tem uma pequena resenha escrita pelo maestro Júlio Medaglia.

Infelizmente não consegui pegar as páginas das reportagens, tendo que me limitar apenas as respectivas capas.

Curiosidade: Rita Lee no início de sua carreira profissional tocou com Tony Campello (ela tinha a banda vocal Teenage Singers com mais três amigas). Em 24 de fevereiro também comemora-se o nascimento de Tony Campello (1936).

PS: Em 24/02/1975 Led Zeppelin lançou Physical Graffiti. Em 24/02/1979 The Police lançou a música "Roxanne". Em 24/02/1984 Léo Jaime lançou o clássico Phodas C.





A música dos Mutantes no Festival

Revista Veja – Edição 4 – 2 de outubro de 1968 (Pág 66)

Eles levaram ao palco do Maracanãzinho, dentro de sua canção, “É Proibido Proibir”, de Caetano Veloso

Os componentes do conjunto Os Mutantes, de São Paulo, foram apanhados de surprêsa pelos aplausos que receberam no Maracanãzinho, Rio, ao apresentarem sua música “Caminhante Noturno” na semifinal brasileira. Êles estavam tão certos de serem vaiados – a exemplo de Caetano Veloso no TUCA –, que já tinham uma resposta preparada: na hora em que a cantora Rita ligou um pequeno gravador na bôca do microfone, a voz que saiu foi a de Caetano Veloso no seu desabafo ante a vaia, e que terminava com a frase “É proibido proibir”.

Sentar nas teclas do piano ou colocar uma barra de ferro nas cordas das guitarras, tudo vale para Os Mutantes, desde que produzam um nôvo som: “Queremos dizer tudo em nossa música, no tema e no som: os ruídos, as vozes, o canto de um pássaro. Novos temas estão em volta do mundo em nós: um dia de sol, um sorriso, muito amor nas pessoas, bancas de jornais, gente”.

Uma família musical – Arnaldo, vinte anos, e Sérgio, dezessete, são irmãos. Faziam parte de um conjunto que só tocava “rock” e “twist” (hoje consideram essa fase de iniciação um lixo), até o dia em que conheceram Rita Lee Jones, dezoito anos, filha de americanos, que integrava por sua vez um conjunto de meninas que cantavam músicas folclóricas americanas. Os dois irmãos convidaram Rita a formar um nôvo conjunto – Os Mutantes (os que mudam, os que transformam). São todos muito versáteis: Rita toca flauta, harpa, guizos, castanhola, cítara e instrumentos de percussão; Arnaldo além de pianista, organista e violoncelista, é um ágil guitarrista; Sérgio estuda quatorze horas por dia a guitarra, o violão e a harmonica-de-bôca. Há também outros instrumentos estranhos, inventados pelo irmão mais velho, Cláudio, especialista em eletrônica: uma espécie de “cello” elétrico, um baixo elétrico com três registros diferentes, e uma guitarra cuja freqüência é alterada sem amplificador, no próprio instrumento. Todo êsse arsenal sonoro é completado pela voz do pai dos rapazes, César Dias Batista, tenor do Coral Paulistano, e pela mãe, uma exímia pianista.

Samba africano, futebol inglês – “No canhão vê folhas / Sêcas, de jornal / Pisa o silêncio, caminhante noturno / Foge do amor que a noite lhe deve / Sem corar, sem falar, nem sonhar”. Em letra e música, Os Mutantes (que só assinam coletivamente suas canções), são tidos como uma versão brasileira dos Beatles. Isso lhes tem criados problemas com a “linha dura” do samba, que os acusa de estrangeirismo. Os Mutantes respondem: “Nossa música não é menos brasileira por gostarmos do que se faz nos Estados Unidos, na Inglaterra. Afinal, o samba é africano, o futebol é inglês e o violão veio de Portugal, como veio também a viola das canções caipiras, dos violeiros e dos repentistas do Nordeste”.




Mutantes, as novidades do segundo LP

Revista Veja – Edição 25 – 26 de fevereiro de 1969 (Pág 61)

Em apenas uma semana, os 3 jovens fizeram um nôvo disco que é para a sua gravadora um futuro sucesso de vendagem. Segundo a crítica, é um avanço musical.


Os Mutantes mudaram? Desde seu primeiro LP, lançado em julho do ano passado, até o segundo, colocado a venda essa semana, os dois rapazes (Arnaldo e Sérgio) e a môça (Rita) mudaram muito, e para melhor, segundo a crítica. “Enquanto os Beatles lançam um álbum bem comportado, de rock açucarado, com lindos efeitos de cordas e cravos, três jovens brasileiros, com a média de vinte anos de idade, surgem com um nôvo LP e conseguem, através do humor e da total desmistificação, ampliar efetivamente os limites da música.” É a opinião do maestro Julio Medaglia, músico de vanguarda para quem as barreiras entre o “erudito” e o “popular” já caíram há muito tempo. Carlos Gonçalves, chefe de divulgação da gravadora Phillips, está apostando no disco, e garante mesmo que “será o campeão de vendagem, o nosso carro-chefe para depois do carnaval.” O primeiro álbum dos Mutantes vendeu 20 000 discos e a gravadora espera uma vendagem mínima de 50 000 para o segundo LP.

Beatles brasileiros? – O nôvo LP dos Mutantes, mais que o primeiro, é uma criação do próprio grupo: apenas quatro faixas contaram com a participação de orquestra. A participação do maestro Rogério Duprat – com quem Os Mutantes colaboraram em seu primeiro disco e no LP “Tropicália” – está bastante reduzida. Em compensação os três técnicos de som trabalharam mais do que nunca atrás de efeitos inéditos. Na faixa “Fuga Nº 2” o acorde final bate um recorde – dura dois segundos mais que o acorde com que termina “A Day in the Life”, dos Beatles. O primeiro LP levou um mês e meio de gravação; o segundo foi feito em uma semana e meia, às vésperas da viagem do conjunto para à Europa, para apresentar-se no MIDEM, em Cannes. Sempre comparados aos Beatles – o “Nice Martin”, diário de maior circulação no sul da França, os chamou de Beatles brasileiros –, Os Mutantes usam acordes dos ingleses na faixa “Rita Lee” (“Ob La Di Ob La Da”) e pistons em acordes repetidos em outras faixas, lambrando o clima de “Penny Lane”.

Caminho novo – Para “o mutante que não aparece”, Cláudio Dias Baptista, 23 anos – é engenheiro eletrônico responsável pelos sons novos dos Mutantes –, “a influencia dos Beatles existe, mas é pequena: o resto é pesquisa nova num caminho que os Beatles abandonaram”. “Dom Quixote” cita música clássica num vocal bem trabalhado e termina com acordes da “Disparada” e a buzina do Chacrinha, Johnny Dandurand – americano que morou no Brasil e cantou ao lado de Caetano Veloso – compôs para eles um número dramático e misterioso, “Dia 36”, cantado dentro do canal de som de um órgão, envolvido pelo som forte de guitarras elétricas. “2001” é o confronto entre instrumentos eletrônicos e a velha viola caipira. Em quase tôdas as músicas, letras bem humoradas, lirismo crítico, colaboração de Tom Zé com versos irônicos, como na faixa “Qualquer Bobagem”: “Escute esta canção / Ou qualquer bobagem / Ouça o coração / Que mais? Sei lá”.


Os Mutantes – Volume II (Pág. 65)

“Uma boa maneira de se fazer revolução é subverter a linguagem”. Depois de pronunciar frases “heróicas” desse tipo, os Beatles lançaram um LP, ainda mais clássico e “musical”, enquanto Os Mutantes, levando tudo na base do humor e da gozação, lançam sua bomba criativa e desmistificadora, mais eficiente na destruição dos conceitos tradicionais do som musical. Os mais belos e engenhosos textos e melodias, são tão musicais, quanto falatórios, beijos, papos, risos, a buzina do Chacrinha e sons espaciais, “dó de peito” de ópera e um recitativo musical gaguejado. O rádio de pilha e a eletrônica, a vaia e o som açucarado da harpa, tachinhas nos martelos do piano, deformações de pronúncia e sons onomatopaicos, vale tudo no rico arsenal musical do conjunto. Um aula de profissionalismo, humor e inteligência que coloca Os Mutantes na vanguarda da música brasileira atual. Destaque para: “Dia 36”, “Qualquer Bobagem”, “2001” e “Caminhante Noturno”.
Julio Medaglia





Um comentário:

Ernesto Ribeiro disse...

A revista Veja ventilou essa mentira: "Rita Lee Jones, dezoito anos, filha de americanos, que integrava por sua vez um conjunto de meninas que cantavam músicas folclóricas americanas."

Na verdade, Rita Lee é filha de BRASILEIROS, com avô paterno americano e avó materna italiana. Ela e as irmãs cantavam músicas folclóricas BRASILEIRAS e americanas.

A-PIOR-IMPRENSA-DO-MUNDO-LIVRE.