10 de fevereiro de 2011

DVD: O Desgaste de Um Formato

Em uma reportagem do Skank, publicada no 2º semestre de 2010, Samuel Rosa abre falando sobre a indiferença de alguns meios de comunicação quanto ao fato da banda ter colocado 50 mil pessoas no Mineirão para gravar o seu DVD.

Entendo Samuel e sua ponta de frustração quanto à repercussão de tal feito que não é para qualquer um. Mesmo sendo de graça, foram lá 50 mil pessoas para assistir ao Skank. Não era festival, era show do Skank! Além disso, o evento foi o último no velho Mineirão que agora está fechado para reforma da Copa 2014.

Samuel acha que talvez seja pelo fato de ter sido feito em Belo Horizonte, fora do eixo Rio-São Paulo. Não acredito nessa hipótese. Eu sei o nome do motivo: desgaste.

Não digo desgaste da banda, longe disso, mas sim o desgaste de um formato de show para DVD que já não atrai tanta atenção – e que jamais atraiu a minha! O problema é que todos os grandes nomes da música querem gravar DVD de forma épica. Por quê?

Falo desses DVDs que trazem uma produção gigantesca, palcos mirabolantes, cenário e iluminação de milhões de dólares, 38 câmeras, 7 gruas, 8 travelings, 19 helicópteros fazendo imagens extras, enfim, muita coisa para absolutamente nada. Todo esse gigantismo exagerado não significa nada para o público. Não vou comprar um DVD do Red Hot Chili Peppers só porque foi gravado na locação ‘X’ com 819 câmeras de alta definição e assistido por duas milhões de pessoas. Vou comprar o DVD do RHCP por outros motivos: tem as músicas que eu gosto? As qualidades de áudio e vídeo são boas? Dá pra ver a banda tocando? As imagens vão me colocar dentro do palco? Se há tudo isso eu compro, principalmente se eu puder ver a banda tocando. Não importa se foi gravado na esquina, sem palco e sem cenário ou no Madison Square Garden com ultra estrutura bilionária. Eu quero poder ver a banda tocando como se tivesse ao lado dos integrantes.

As emissoras, gravadoras, artistas e empresários, sentam para conversar e a única coisa que conseguem pensar é no quanto deverá ser grande a produção. Errado. Muito errado. Eu amo spaghetti a bolonhesa, mas se ficar comendo todo dia eu vou enjoar.

Eu gosto muito mais de poder ver uma apresentação intimista, do que algo épico. Eu tenho um DVD do The Cure chamado Trilogy. Um épico de três discos onde a banda reproduz ao vivo três discos inteiros: Pornography, Desintegration e Bloodflowers. É lindo, mas muito melhor é o Acústico descompromissado que a banda fez para a MTV nos anos 1990, onde todos tocaram sentados no chão, com as câmeras bem perto. A banda tocava e ria pela diversão. Mesmo curta, essa apresentação é impagável. Como profissional, fã e consumidor, prefiro muito mais um produto que me coloque ao lado do artista, que seja mais simples, mas que me proporcione uma certa intimidade que jamais terei em um show no Mineirão ou Maracanã. Faça isso e eu pago o preço que for.

Outra coisa que é chata na maioria dos shows que vemos na TV e em DVDs é a forma como ele é editado e/ou cortado. É tudo uma bola de neve: se você pede para ter 427 câmeras, na hora da edição ou exibição terá que justificar o custo mostrando-as todas. Aí fica uma coisa louca de cortar de uma câmera para a outra e você em casa vê um monte de imagens sem assimilar nada. O corte de câmera é tão frenético que você não consegue ver o vocalista cantando, o guitarrista solando, o baterista tocando. Mostra o vocalista, mostra o público, mostra imagem do helicóptero, mostra o baterista, mostra o baixista, mostra a menina chorando, mostra o vocalista, mostra o público. Coisa de doido.

Esse tipo de corte frenético começou a ser feito nos anos 1980, quando alguém resolveu fazer um show como se fosse videoclipe e isso acabou virando "regra", com os profissionais trabalhando no automático. Você pensa em um DVD e logo vem à cabeça aquele monte de imagens que te mostra tudo e você não vê nada. Prefiro uma edição mais lenta, que mostre de fato o artista executando seu instrumento, que dê tempo para eu ver e entender a imagem que está sendo mostrada.

Acredito que o que acontece agora é o que já aconteceu com o Acústico: o desgaste do formato. Inclusive na MTV americana ele deixou de ser produzido ainda nos anos 1990. Aqui no Brasil não, até por força das gravadoras que gostam de Acústicos. Esse projeto surgiu com a intenção de se fazer algo diferente e mais intimista (foi criado por um operador de câmera), mas foi tomando outras proporções. Na MTV uma das minhas funções era exatamente receber e assistir todos os Acústicos internacionais e prepará-los para ir ao ar aqui. Vi tudo. Os mais legais eram aqueles mais sem compromisso. Nem vou nominar porque são muitos, mas o do Cure é um bom exemplo, o do Live e o da Legião Urbana também.

Como consumidor e fã, pra mim uma imagem de um helicóptero mostrando um público gigante ou um plano geral que mostra o quanto o palco é enorme só me distancia do artista. Fica frio. EU não gosto.

Mas não quero ser radical, há momentos em que esse formato mais dinâmico funciona e é bem vindo. Eu mesmo trabalho dessa forma quando é preciso. Um bom exemplo são as transmissões ao vivo de festivais.

Esses DVDs ‘Ao Vivo’ feitos em parceria, principalmente, com emissoras de TV, podem e devem ter uma edição épica para a televisão, mas para o DVD vendido em loja vale uma edição especial, mais intimista, porque mesmo sendo ao vivo no Cristo Redentor para 10 milhões de pessoas, dá para fazer uma edição diferente.

O mercado há tempos carece de produções mais autorais e menos padronizadas.



CURE!!!



Stop Manking Sense do Talking Heads é minha eterna referência. Foi dirigido por Jonathan Demme que depois fez Totalmente Selvagem e O Silêncio dos Inocentes, entre outros filmes.



Este especial com Nando Reis e Skank tocando as parcerias de Nando e Samuel fui eu que fiz. Logo na primeira reunião quando me chamaram, houve consenso em trabalhar com uma luz fixa para valorizar não só a fotografia como a direção de arte; e também com um corte mais lento, com movimentos com começo, meio e fim.

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