29 de maio de 2010

Olho de Peixe & Astronauta Tupy


Assim como a década de 1980, a de 1990 também é recheada de clássicos. Dá pra citar Raimundos, Chico Science e Cássia Eller como alguns artistas donos de alguns desses clássicos. Mas há dois álbuns que, pra mim, são fundamentais para a música brasileira: ‘Olho de Peixe’ de Lenine e ‘Astronauta Tupy’ de Pedro Luís e a Parede.

Foi numa fita cassete emprestada de uma amiga de Porto de Galinhas (PE) que ouvi pela primeira vez Olho de Peixe, que Lenine lançou em 1993/94. Isso aconteceu pouco mais de um ano depois do lançamento.

Caí pra trás, perdi o chão, fiquei tonto e quando voltei ao normal nada era como antes. Como eu, muitas pessoas também viram a mudança de rumo que esse álbum trouxe para a música brasileira. A forma de tocar o violão, a percussão, as dinâmicas, os timbres. Um álbum basicamente de violão e pandeiro. É um trabalho que nota-se a mistura de levadas brasileiras, mas que não descarta o rock em certos momentos. Nunca em primeiro plano ou sendo protagonista, longe disso. É como diz o músico Juca Novaes em seu blog, onde cita a mistura criada pela Tropicália.

Olho de Peixe foi uma injeção de ânimo para a música brasileira. Isso não é exagero, é um fato. Um novo ângulo, um novo jeito e isso em plenos anos 1990, quando o grunge reinava no mundo pop e a MPB estava numa mesmice absoluta. Desse álbum é bom escutar até a reverberação do estúdio.

 Mas não é só a sonoridade que é original. As letras e a interpretação também fizeram a diferença. O uso do violão como, digamos, percussão acidental. A mistura de Recife com Rio de Janeiro ficou bacana e tão natural e espontânea que não é nada estranho ouvir frases como “Surfista na Central” e “Metaleiros no Maraca” no mesmo lugar onde tem “Sou um boneco de mestre Vitalino / Dançando uma ciranda em Itamaracá”.

Passei anos sem ter esse álbum. A fita que eu escutei foi devolvida e demorou muito pr’eu conseguir outra. Lembro que a primeira vez que Lenine foi à MTV fiz questão de descer na sala onde ele estava. Primeiro para cumprimentá-lo e conhecê-lo, e depois pra perguntar o motivo pelo qual não se fazia uma nova edição de ‘Olho de Peixe’. Isso foi na época do lançamento do ‘O Dia em Que Faremos Contato’ e ele me disse que muita gente perguntava do Olho de Peixe. Tempos depois comprei um CD usado que algum maluco deixou numa lojinha que eu frequentava, e acabei não sabendo quanto tempo levou para uma nova edição sair. Eu percebo nesse álbum um clima bastante parecido com o álbum ‘Caetano’, que Caetano Veloso lançou em 1987 (que tem “Fera Ferida”). Por coincidência e em épocas diferentes ouvi esses dois álbuns em casas no meio do mato, na tranquilidade.

‘Astronauta Tupy’ foi outro tapa na cara, murro na boca do estômago, cabeçada no nariz.

Conheci Pedro Luís e a Parede de uma forma inusitada. O prédio onde fica a MTV tem nove andares e em cada um deles ficam departamentos diferentes, desde a direção e o restaurante, até o jornalismo e a produção. Estando tudo combinado entre a gravadora e o departamento de relações artísticas, PLAP desceu de escada do 9º andar ao térreo tocando suas músicas de forma acústica e com, literalmente, panelas na mão, passando por todos os departamentos. Tomei um susto quando entraram na produção, fiquei olhando, os cumprimentei com a cabeça, fiquei curtindo, e quando a garota da gravadora passou, perguntei o nome da banda, pedi um CD e ela me deu na hora. Quando saíram sentei pra ver a capa do CD e depois de ver que a produção era de Tom Capone até liguei pra ele.

 Assim como o ‘Olho de Peixe’ – que também inspirou bastante Pedro Luís – o ‘Astronauta Tupy’ também tem uma sonoridade acústica e brasileira bastante acentuadas. Traz também misturas inusitadas como violões, baixo fretless e percussão feita com panelas, latas, Tambores e até piso de alumínio (que serve de reco reco).

Tom Capone àquela altura já começava a ficar conhecido entre o meio musical, seus trabalhos no AR Studios foram muito marcantes. Com Tom também estava outro amigo de Brasília, Mauro Manzoli, que infelizmente foi embora cedo como Tom.

Bem, ‘Astronauta Tupy’ se tornou outro clássico fundamental dos anos 1990, e trouxe com ele outra forma de mistura entre MPB e rock. O baixo fretless também me faz recordar alguns momentos do ‘Caetano’ e a impressão que dá é que todos estavam muito bem preparados para fazer esse álbum e Tom teve tempo e um bom clima para tirar a sonoridade perfeita.

Ao contrário de ‘Olho de Peixe’ que surgiu num momento em que o Brasil não tinha nada de novidades, o ‘Astronauta Tupy’ foi lançado em 1996, junto com outros álbuns importantes como ‘O Samba Poconé’ do Skank, ‘Lavô Tá Novo’ do Raimundos, ‘Rappa Mundi’ d’O Rappa e ‘Afrociberdelia’ de Chico Science. Mas ‘Astronauta Tupy’ não bateu de frente com nenhum desses lançamentos e nem tinha a sonoridade parecida. Era algo a parte do que acontecia no rock e na MPB.
“Pena de Vida”, “Tudo Vale a Pena”, “Caio no Swing”, “Miséria no Japão”, “Chuva de Bala”, são algumas das composições de respeito desse álbum. Algumas delas foram regravadas por diversos outros altistas. Anos depois do lançamento fiz a direção artística da transmissão ao vivo do show do PLAP e Cake no Free Jazz de 1999.

São dois clássicos absolutos que, mesmo lançados numa década onde a revolução tecnológica tomou outro rumo, conseguiram com suas sonoridades acústicas e simples, plantar sementes que até hoje dão frutos. Seja no rock ou na MPB.

Esse clipe aqui é também em homenagem ao velho amigo Tom

Nenhum comentário: