13 de janeiro de 2008

Entrevista com Arnaldo Antunes

Em 2000 após sete de MTV Brasil, saí da emissora e fui ser editor de música de um site chamado TantoFaz.net que hoje não existe mais. Naquele ano inclusive ganhamos o prêmio IBest de Melhor Site Para Adolescentes. Bom, o fato é que entrevistei muita gente legal. Muitas dessas entrevistas perdi, mas outras acabei encontrando em disquetes que julgava perdidos. Aqui é a vez de Arnaldo Antunes e essa conversa foi realizada na casa dele no primeiro semestre de 2000.

Paulo Marchetti – Você está indo pra Europa?
Arnaldo
– Vou fazer um show no Porto, em Portugal; um show em Cartagena, na Espanha e um show em Lisboa. Por enquanto o que está confirmado é isso, mas vamos tentar aproveitar que estaremos lá pra tentar fazer mais coisas. Tem um empresário de lá que está nos ajudando.
Na verdade serão duas viajens, porque estaremos gravando o disco novo. A partir da segunda quinzena de junho eu entrarei em estúdio. Então eu tenho um show em Porto, no final de junho, a gente faz esse show, volta pra cá, continua a gravar o disco e depois, no final de julho, tem Cartagena e Lisboa.

Paulo Marchetti – De onde surgiu esse interesse?
Arnaldo
– Fomos procurados por dois organizadores… na verdade são dois festivais. Esse ano tem muita comemoração de 500 anos do Brasil lá em Portugal também, então tem alguns festivais que eles estão levando coisas do Brasil, principalmente na área da música. Nós já vínhamos mandando material pra fora, mas foi só agora que surgiu essa oportunidade, com excessão do ano passado, que tocamos em Buenos Aires mas, na Europa, será a primeira vez.

Paulo Marchetti – Mas tem algum disco seu lançado por lá?
Arnaldo
– “Um Som” foi lançado na França e está saindo agora em Portugal, em consequência dos shows que faremos.

Paulo Marchetti – Seu primeiro disco é bastante experimental. A maioria das músicas são assinadas sem parceria. Foi uma opção?
Arnaldo
– Eu sempre compus muito, então esse negócio de eu assinar as músicas sozinho é natural…

Paulo Marchetti – Mas os outros três discos tem muita parceria…
Arnaldo
– Tem mais parceria que o “Nome”, mas é porque ele é um trabalho muito autoral mesmo. Na verdade começa por ele ser bastante singular dentro do que eu fazia na área de música, por ser um trabalho relacionado com outras linguagens. Era um projeto grande que envolvia não só a feitura do disco, mas também a feitura de um vídeo com animação em computador e tinha um livro que acompanhava esse vídeo. Era um trabalho que envolvia um híbrido de música com poesia, com linguagem gráfica, com imagem em movimento. Tem uma série de outras linguagens que vão se articulando nesse projeto.


Paulo Marchetti – Era uma coisa que você já tinha?
Arnaldo
– Na verdade, foi um projeto que eu vim trabalhando ainda quando estava no Titãs. Fiquei uns dois anos realizando, porque o trabalho de animação é muito lento e, com o tempo, tudo que eu vinha compondo musicalmente e que não cabia no Titãs, eu ia migrando pra esse projeto. Então aquilo foi tomando corpo, foi crescendo comigo ainda no Titãs. Aí eu saí da banda e pude me concentrar na finalização desse projeto com mais tempo. Mas era um trabalho muito singular, muito particular, pelo fato de ter essas linguagens todas dialogando num mesmo projeto. Ao mesmo tempo eu estava saindo do Titãs e queria marcar o fato de eu estar saindo, fazendo um trabalho muito diferente daquilo que eu vinha fazendo. Então todas essas questões me levaram a fazer um disco como foi o “Nome”. Eu tinha o desejo de, em algumas faixas, trabalhar com alguma coisa que empurrasse um pouco dos limites daquilo que nós chamamos de canção, então violentava um pouco a estrutura tradicional de canção. Mas essa coisa de experimental eu acho que tem um pouco em cada disco que eu fiz.

Paulo Marchetti – Por não ser um instrumentista, você tem difilculdades para compor?
Arnaldo – Não, eu na verdade não me sindo um instrumentista, mas eu toco o suficiente pra eu poder compor. Eu toco alguns acordes, invento algumas harmonias, meu jeito de criar, programo uma bateria e vou fazendo as coisas com os recursos que eu tenho e que me são suficientes. O que me leva muito a querer compor em parceria, não é por incapacidade de compor sozinho, mas é pelo desejo de dialogar. As coisas que eu faço em parceria, muitas vezes me fazem criar coisas que eu não faria sozinho, pelo exercício de você se adaptar a linguagem de outra pessoa. É excitante você compor em parceria por causa disso, porque você é levado a fazer coisas que, sozinho, você não estaria fazendo. Então eu gosto de trabalhar com parceiros dos mais diversos, tem muita gente com quem eu componho junto e isso e um exercício excitante pra mim.

Paulo Marchetti – Isso tem haver com o fato de cada disco ter um produtor diferente?
Arnaldo
– É uma coisa de poder estar experimentando também. Diferentes sonoridades, cada produtor apresenta um diálogo diferente e não tem porque ser o mesmo.

Paulo Marchetti – Seu segundo disco “Ninguém” foi produzido pelo Liminha, que trabalhou muito com o Titãs. Ele quis aproximar seu som ao do Titãs?
Arnaldo
– Não, de maneira alguma. Eu até o chamei, porque sempre gostei de trabalhar com ele no Titãs. Elé é um produtor que sabe contribuir para que aquilo atinga sua meta natural, sem querer desviar o rumo do trabalho.

Paulo Marchetti – O “Ninguém” é mais Pop que “O Nome”…
Arnaldo
– Olha, a cada disco que eu lanço o pessoal da mídia em geral fala: “O Arnaldo agora está mais Pop”. Mas meu trabalho nunca deixou de ter essa intenção, de tocar no rádio, de estar dentro do universo de música Pop do Brasil, de ser ouvido por um maior número de pessoas possível. Nunca quis sair muito disso. Eu tô gostando que as pessoas vem dizendo isso a cada disco que lanço e espero que isso leve a tocá-los nas rádios. De qualquer forma, se estão considerando meu trabalho mais Pop, eu acho bom.

Paulo Marchetti – Todo disco seu tem pelo menos uma referência `a Bossa Nova ou Samba…
Arnaldo
– Isso sempre teve. Sempre tive uma paixão pela tradição da MPB, isso sempre conviveu no meu repertório. Nunca houve conflito entre minhas influências Pop e Rock com a MPB. Nunca houve um conflito entre essas coisas. Eu sempre ouvi, com muita naturalidade, Luís Gonzaga e James Brown, Jimi Hendrix e Lupicínio Rodrigues, Caetano Veloso e Bob Marley. Essas coisas nunca brigaram, sempre foi natural minha convivência com a MPB de várias épocas… a tradição do Samba. E isso sempre esteve presente em meu trabalho, em músicas como “Alegria”, como “Doce do Mar”, como “Volte Para Seu Lar”. Agora, o que me interessa, de alguma forma, é criar esse tráfego entre os diferentes gêneros musicais. Criar uma informação original, própria, mas que possa transitar livremente entre os diferentes universos musicais.

Paulo Marchetti – De onde vem a influência eletrônica? Já no Titãs você fazia coisas como “O Que”…
Arnaldo
– Quem ensinou o Titãs a lidar com samplers, programação eletrônica, foi o Liminha. Ele abriu pra gente esse universo, que era uma coisa que, até então, nós não conhecíamos. Na época do “Nome”, passei a lidar com programação eletrônica. Hoje em dia eu gravo tudo num Pro Tools, editando… a coisa eletrônica já faz parte do processo.

Paulo Marchetti – Você escuta música Techno?
Arnaldo
– Não. Meu interesse é apenas na forma de gravar. Não tenho influências eletrônicas. Escuto alguma coisa quando o Edgard Scandurra me mostra, porque ele tem um interesse mais profundo com esse tipo de música, então ele, `as vezes, me traz alguma coisa pra escutar. O máximo que eu cheguei a escutar, foi um Massive Attack.

Paulo Marchetti – Como surgiu a idéia de chamar o Edgard Scandurra pra tocar com você?
Arnaldo
– Nós sempre tivemos uma sintonia, sempre fui admirador de seu jeito de tocar guitarra, sempre gostei daquilo. Na época da gravação do “Nome” eu o chamei pra tocar em algumas faixas e depois, quando fui fazer o show, ele topou fazer e foi ficando. Depois, naturalmente, acabamos compondo coisas juntos. Eu também participei do disco dele, participei de um show do Ira!…

Paulo Marchetti – Essa amizade vem desde o início dos anos 80?
Arnaldo
– Vem. Nós sempre nos encontrávamos nos shows. O Titãs já dividiram alguns shows com o Ira!…

Paulo Marchetti – E o disco que você gravou com sua primeira banda Aguilar & Banda Performática?
Arnaldo
– Seria legal relança-lo em CD, né? Mas não sei quais são os planos do Aguilar em relação a isso. A Banda Performática foi muito bacana. Eu participei dela durante uns dois anos, antes de existir o Titãs e depois também. Teve um período em comum, onde participava das duas bandas. Esse disco da Banda Performática foi gravado em 81 e, em 82, começou o Titãs.

Paulo Marchetti – Você ainda tem algum contato com o Aguilar?
Arnaldo
– Tenho. Eu, inclusive, fiz um texto de apresentação da última exposição dele e, de vez em quando, nos encontramos. Ainda somos amigos.

Paulo Marchetti – Você prefere escrever ou compor?
Arnaldo
– Eu não gosto de eleger uma prioridade. Eu gosto de fazer coisas diferentes. Eu nunca me senti especializado… me agrada poder fazer as duas coisas. Acho que o que eu mais gosto de fazer, como realização física mesmo, é show. Que é uma sensação muito plena, essa coisa de estar em cima de um palco, cantando pra várias pessoas, isso é muito bacana, muito legal.

Paulo Marchetti – E disco ao vivo?
Arnaldo
– Ainda não fui pego por essa onda. É claro que um dia eu farei, mas está todo mundo fazendo e acho isso chato. Eu não gosto muito desse negócio de onda. Agora todo mundo faz disco ao vivo, então é melhor eu fazer outra coisa.

Paulo Marchetti – Como será o próximo disco?
Arnaldo
– Ele será produzido pelo Dudu Marote. Eu fiz uma fita com muitas coisas que eu penso em gravar. Tem parcerias, tem músicas minhas e tem até músicas de outras pessoas. Registrei tudo isso e tenho 28 músicas. Eu a escutei junto com Dudu e, dessa fita, eu quero tirar umas dez ou doze pra gravar. Estou na fase de compor e registrar as coisas que vão surgindo, tô escolhendo o repertório… Até meados de maio eu ficarei nessa, depois começo a ensaiar um pouco o repertório e entraremos em estúdio no começo de junho. Eu geralmente faço uma pré produção, gravo uma demo antes de entrar em estúdio para o disco, mas isso sempre teve um lado meio complicado porque nós conseguimos um clima legal na demo e depois queremos reproduzi-lo na gravação do disco e acabamos perdendo a espontaneidade então, dessa vez, eu decidi que iremos gravar direto. A única coisa que rolará, serão alguns encontros e ensaios.

Paulo Marchetti – Você está pensando em alguma participação especial?
Arnaldo
– Por enquanto está cedo pra dizer. Talvez role alguma coisa, mas não há nada definido.

Paulo Marchetti – Você ainda faz parcerias com alguém do Titãs?
Arnaldo
– Continuo compondo com eles e, provavelmente, terá alguma coisa nesse próximo disco. Agora pouco eu estava falando, por telefone, com o (Sérgio) Britto, porque eu deixei algumas letras com ele e nós nos encontraremos pra ele me mostrar o que fez.

Paulo Marchetti – Como é sua relação com seus filhos?
Arnaldo
– Eu tenho a Rosa, que tem onze anos; a Celeste, que tem nove e tem o Brás com três anos. Minha relação com eles é super legal. Filho é a melhor coisa que tem, é o máximo. Eu adoro todos eles. Nossa relação é muito aberta.

Paulo Marchetti – O que você lembra daquele episódio, em 86, onde você foi preso por porte de heroína?
Arnaldo
– Eu nem penso nisso. Eu acho estranho que, depois de quinze anos, ter que dar entrevista e falar disso. Foi uma coisa que aconteceu, eu usava naquela época, fui pego e preso com aquilo e é uma coisa chata que poderia acontecer com qualquer pessoa… Na época eu escrevi sobre isso no jornal, falei muito sobre isso e agora chega.

Paulo Marchetti – Sua agenda está legal? Você tem percorrido o Brasil inteiro?
Arnaldo – Com esse último disco nós fizemos muitos shows pelo Brasil. A cada disco lançado, nós conseguimos fazer um pouco mais de shows, então o trabalho está crescendo devagar. É como eu falei, recomecei minha carreira a partir do momento em que saí do Titãs e ela está crescendo.

Paulo Marchetti – Como foram os shows em Buenos Aires?
Arnaldo – Foram super legais. Fizemos três shows num teatro, dentro de um festival de artes que envolvia cinema, teatro, fotografia… O público foi maravilhoso, a imprensa eu achei de altíssimo nível, super respeitosa. O público é exigente e, ao mesmo tempo, muito caloroso. Engraçado, porque no primeiro dia foi um público mais curioso e ficaram sentados, como é em shows feitos em teatro. No final aplaudiram em pé. No segundo dia, no bis, já havia gente dançando e, no último dia, desde a primeira música até a última, ficou todo mundo em pé, dançando. Foi muito legal.

Paulo Marchetti – Você está pensando em tocar pela América Latina?
Arnaldo – Adoraria, mas depende de convites. Não depende tanto de nossa vontade.

Paulo Marchetti – Quando sai o novo disco?
Arnaldo
– Talvez em setembro

Paulo Marchetti – As pessoas pedem pra você tocar músicas do Titãs?
Arnaldo
– Não. Quem vai ao meu show, vai para escutar minhas músicas. Quem quiser ouvir Titãs vai ao show do Titãs (risos). Na época do Acústico, que eu participei cantando “O Pulso”, algumas pessoas em meus shows pediam essa música, mas nunca houve essa cobrança de ter que tocar Titãs.

Paulo Marchetti – Você está satisfeito com o que tem feito?
Arnaldo – Tô. Faço o que quero, estou muito realizado, trabalhando com toda liberdade.

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